REFLEXOS REFLEXÕES
SOXELFER SEÕXELFER
Veneza, paixão à primeira vista pela cidade desde 1978, recém-chegada do Brasil e quase virgem de Europa. Foi minha morada de 1978 a 1990, voltei em 1997-98, e definitivamente em 2012 até hoje.
Quanto aos reflexos, estudando a história da Catedral da Piazza San Marco,diz-se que no projeto arquitetônico inicial, constava um rio ou canal na frente da fachada para que o reflexo da cúpula bizantina pudesse sugerir uma esfera.Taj Mahal? Que metades são essas? Metade da esfera construída em pedra, de mármore, na vertical; a outra metade visual, virtual, formada de reflexos, construída de luz e água, projetada na superfície, não tridimensional. Será que Veneza foi planejada e estudada para ser múltiplas cidades em uma, que muda conforme a luz? As imagens, muitas vezes abstratas, que se formam nos canais me atraem, me puxam, me chamam, me fazem querer entrar por portas e janelas imaginárias, mergulhar num reflexo ou espelho, como a Alice do Lewis Carroll, e me encontrar em outra dimensão. Me lembro do fascínio que tive ao ver o filme o Gabinete do Dr. Caligari, os desenhos de Escher, 2001 Uma Odisseia no Espaço, de Kubrick, o misterioso Nú descendo as escadas de Marcel Duchamp, e quando era criança, por exemplo, a primeira sensação da relação de grande e pequeno, tipo a relação de uma formiga e o musgo, nós e uma floresta.
Passeando sem direção determinada, nem física nem de pensamento, e munida de máquina fotográfica, fui colecionando as imagens que apresento pela primeira vez na Martha Pagy Escritório de Arte. Eu havia mostrado algumas imagens à Martha, que me estimulou a continuar minha viagem [dentro da viagem]. Fui notando algumas estruturas arquitetônicas passageiras, perspectivas móveis, que brincam com a imaginação, oníricas, dentro dos canais, imagens que nunca se repetiriam se eu não as congelasse com uma câmera fotográfica. Olhos abertos, atentos e no alto, nos raros dias de céu azul, notei que dentro de janelas existiam outras janelas refletidas. Fiz anotações fotográficas. O quê abre o quê? Fotografei o que pude enxergar, sem pressa, por amor, por atenção, por simplesmente estar onde estou.
Tive imensa dificuldade em escolher as imagens pois pensei inicialmente num número reduzido, cerca 20 imagens, mas selecionei mais de 200. Roberto Cecato, meu irmão e fotógrafo, me ajudou na seleção e edição das fotos. Paolo Maria Noseda, revisou e aperfeiçoou o texto nas três línguas e foi fundamental na decisão de imagem e design. Para mim é como abrir as portas da minha própria casa para quem quiser entrar, faço de Veneza minha casa, desses reflexos os meus cômodos. A dicotomia mágica de estar do lado de fora, na superfície, mas também no lado de dentro, dentro dos canais, no subconsciente de quem visita a cidade. Espero que as imagens pesquem os olhares, e que se sinta a necessidade de vir conhece-las de perto e talvez saborear o mesmo amor que sinto por esta cidade. Uma das expressões geniais de Deleuze sobre o artista é que é um mostrador de afetos, inventor de afetos, criador de afetos. Essas imagens me são íntimas, são meus afetos.
DESENHOS E PINTURAS
Sobre o papel Nepal usado na nova série de trabalhos, foram feitos à mão nos anos 70 pelo artista Antonio Dias, com quem fui casada muitos anos, e que me deu de presente quando nos separamos em 2012. Uma curiosidade, Antonio sempre foi fã dos meus desenhos, e foi ele que me apresentou à curadora e galerista Martha Pagy em meados de 2000, encontro que resultou na nossa primeira exposição em 2003. Quando Antonio me ofereceu generosamente o precioso lote, me disse que não tinha mais intenção de fazer trabalhos sobre papel.
Quanto à minha relação pessoal com um papel feito à mão há 50 anos no meio de uma floresta no alto de uma montanha nepalesa, posso dizer que, apesar de ter pintado e desenhado sobre eles, me sinto, assim como com as foto-reflexos, quase passiva, uma observadora, à escuta do que esses papéis tem a me dizer, como se fosse minha missão, a de lê-los, escrevê-los, decifrá-los. Usei a técnica de impressão em seda de quimonos, os Katagamis, do início do século passado, que encontrei na antiga cidade de Kyoto, num antiquário. Eles me pareciam guardar segredos como os dos misteriosos papiros egípcios, me sugeriam cartas gráficas, geográficas, códigos de quem escreve à quem lê. Enquanto as fotos são de reflexos, os trabalhos em papel são reflexões, e como a qualidade intrínseca de tudo que é refletido, os trabalhos nascem de um contraponto. Tento capturar o segundo que acaba naquele segundo. E assim, para sempre.
REFLECT REFLECTIONS
TCELFER SNOITCELFER
Venice, passion at first sight for the city since 1978, newcomer from Brazil and almost virgin of Europe. It has become my address from 1978 to 1990, then again in 1997-98, and definitely back in 2012 to this day. As for the reflections on water, studying the history of piazza San Marco's Cathedral, it is said that in the initial architectural project, there was a river or canal in front of the façade so that the reflection of the Byzantine dome could suggest a sphere. Taj Mahal? What are those halves? Half of the sphere built in stone, marble, vertical; the other visual half, virtual, formed of reflections, constructed of light and water, projected on the surface, not three-dimensional. Was Venice planned and studied to be multiple cities in one, which changes according to the light? The often abstract images reflections on the canals attract me, pull me, call me, make me want to enter through imaginary doors and windows, dive into a reflection or mirror, like Lewis Carroll's Alice, and find me in another dimension. I remember the fascination I had when I saw the film The Cabinet of Dr. Caligari, Escher's drawings, 2001 A Space Odyssey, from Kubrick, the mysterious Nude Descending a Staircase byMarcel Duchamp,
and when I was a child, for example, the first feeling of the relationship of large and small, like the relationship of an ant and the moss, humans and a forest.
Walking without a determined direction, neither physically nor with my mind, and equipped with a camera, I have been collecting the images I present now for the first time in Martha Pagy Escritório de Arte.In the past, I had shown some images to Martha, who encouraged me to continue my journey [within the journey]. The beauty of some passing architectural structures, moving perspectives, which play with the imagination, dreamy, within the canals, images that would never be repeated if I didn't freeze them with a camera. Eyes open, attentive and high up, on the rare days of blue sky, I noticed that inside some windows there were other reflected windows. I took photo-notes. What opens what? I photographed what I could see, without haste, for love, for attention, for simply being where I am.
It was hard choosing the images because I initially thought of a small number, about 20 images, but I selected more than 200. Roberto Cecato, my brother and photographer, helped me in the selection and edition of the photos. Paolo Maria Noseda, revised and perfected the text in the three languages and was fundamental in the choices on the image and design. For me it's like opening the doors of my own house for anyone who wants to come in, I make Venice my home, and the reflections my rooms. The magic dichotomy of being outside, on the surface, but also on the inside, inside the canals, in the subconscious of those who visit the city. I hope the images call people’s attention and stimulates them to come see by themselves, and maybe taste the same kind of love I feel for this city.
One of Deleuze's comments about an artist is that he is a “demonstrator” of affections, inventor of affections, creator of affections. These images are intimate to me, they are my affections.
DRAWINGS AND PAINTINGS
About the Nepal paper I used in this new series of works, they were handmade in the 1970s by artist Antonio Dias, with whom I was married many years, and who gave me the paper as a gift when we separated in 2012. A curiosity, Antonio has always been very fond of my drawings and it was he who introduced me and my work to the curator and gallerist Martha Pagy around the year 2000, resulting in our first exhibition in 2003. When Antonio generously offered me the precious lot, he told me he had no intention of doing works on paper anymore.
As for my personal relationship with a handmade-paper done 50years ago in the middle of a forest in the heights of a Nepalese mountain, I can say that despite having painted and drawn on them, I feel, as well as with the photo-reflexes, almost passive, an observer, listening to what these papers have to tell me, as if it were my mission, to read them, write them, decipher them. I used the kimonos silk printing technique, the so-called Katagamis, from the beginning of the last century, which I found in an antique shop in Kyoto. They seemed to keep secrets like those of the mysterious Egyptian papyri, they suggested graphic letters, geographic maps, codes from those who write to whom will read them, writers to readers. While the photos are of reflections, either on water or in windows, the works on paper are about reflecting, considering, and as it is the intrinsic quality of everything that is reflected, these works are born from a counterpoint. I try to capture the second that ends in a second. And so on, forever.
RIFLESSI RIFLESSIONI
ISSELFIR INOISSELFIR
Venezia, passione a prima vista per la città dal 1978, appena arrivata dal Brasile e quasi vergine d'Europa. Divenne mio indirizzo dal 1978 al 1990, poi nel 1997-98, e finalmente sono tornata a viverci nel 2012 fino ad oggi.
Riguardo i riflessi sull’acqua, studiando la storia della Cattedrale di Piazza San Marco, si dice che nel progetto architettonico iniziale, c'era un fiume o un canale di fronte alla facciata in modo che il riflesso della cupola bizantina potesse suggerire una sfera. Taj Mahal?Cosa sono quelle metà? Metà della sfera costruita in pietra, marmo, verticale; l'altra metà visiva, virtuale, formata da riflessi, costruita di luce e acqua, proiettata in superficie, non tridimensionale. Venezia è stata progettata e studiata per essere una città multipla in una, che cambia a seconda della luce? Le immagini, spesso astratte, che si formano nei canali mi attraggono, mi tirano, mi chiamano, mi fanno venire voglia di entrare attraverso porte e finestre immaginarie, tuffarmi in un riflesso o in uno specchio, come Alice di Lewis Carroll, e trovarmi in un'altra dimensione. Ricordo il fascino che ho avuto quando ho visto in film Il gabinetto del dottor Caligari (Das Cabinet des Dr. Caligari)*, i disegni di Escher, 2001 Odissea nello spazio, di Kubrick, il misterioso Nudo che scende le scaledi Marcel Duchamp,e quando ero bambina, per esempio, la prima sensazione del rapporto tra il grande e il piccolo, come il rapporto tra una formica e il muschio, noi umani e una foresta. Camminando senza direzione, né fisica né di pensiero, e dotata di una macchina fotografica, passai anni raccogliendo le immagini che presento ora per la prima volta a Martha Pagy Escritório de Arte. In passato, infatti, mostrai alcune immagini di questa serie a Martha, che mi ha incoraggiato a continuare il mio viaggio [all'interno del viaggio]. La bellezza di strutture architettoniche di passaggio, prospettive in movimento, che giocano con l’immaginazione, sognanti, all'interno dei canali, immagini che non si ripeterebbero mai se non le congelassi con una macchina fotografica.
Occhi aperti, attenti e verso su, in alto, nei rari giorni di cielo azzurro, ho notato che all'interno di certe finestre c'erano altre finestre riflesse. Ho preso appunti fotografici. Cosa apre cosa? Ho fotografato quello che potevo vedere, senza fretta, per amore, per attenzione, per essere semplicemente dove sono. Ho avuto un’enorme difficoltà a scegliere le immagini perché inizialmente avrei pensato a un piccolo numero, circa 20 immagini, ma ne ho selezionato più di 200. Roberto Cecato, mio fratello e fotografo, mi ha aiutato nella selezione e edizione delle foto. Paolo Maria Noseda, ha revisionato e perfezionato il testo nelle tre lingue ed è stato fondamentale nelle scelte sull'immagine e sul design. Per me è come aprire le porte della mia casa per chiunque abbia voglia di entrare, faccio di Venezia la mia casa, da questi riflessi le mie stanze. La dicotomia magica di essere fuori, in superficie, ma anche all'interno, all'interno dei canali, nel subconscio di chi visita la città. Spero che le immagini peschino gli sguardi, e provochi un desiderio di incontrarle, vederle da vicino e magari assaporare lo stesso amore che provo per questa città. Una delle idee di Deleuzeè che l’artista sarebbe un “dimostratore” di affetti, un inventore di affetti, un creatore di affetti.
Queste immagini mi sono intime, sono i miei affetti.
DISEGNI E PITTURE
Riguardo la carta Nepal che ho usato nella nuova serie di opere, sono state fatte a mano negli anni '70 dall'artista Antonio Dias, con il quale sono stata sposata per molti anni, e me li ha regalate quando ci siamo separati nel 2012. Curiosità, ad Antonio sono sempre piaciuti i miei disegni ed è stato lui a presentare me e il mio lavoro alla curatrice e gallerista Martha Pagy intorno al 2000, dando vita alla nostra prima mostra nel 2003. Quando Antonio mi ha generosamente offerto il tesoro nepalese, mi ha detto che non aveva più intenzione di fare lavori su carta. Per quanto riguarda il mio rapporto personale con una carta fatta a mano 50 anni fa in mezzo a una foresta in alto a una montagna nepalese, posso dire che, pur avendo dipinto e disegnato su di loro, mi sento, come con le foto-riflessi, quasi passiva, una osservatrice, ascoltando ciò che queste carte hanno da dirmi, come se fosse la mia missione, leggerli, scriverli, decifrarli. Ho usato la tecnica della stampa in seta dei kimono, i Katagamis, dell'inizio del secolo scorso, che ho trovato a Kyoto, in un negozio di antiquariato. Sembravano mantenere segreti come quelli dei misteriosi papiri egiziani, mi suggerivano lettere grafiche, carte geografiche, codici da chi scrive a chi legge. Mentre le foto sono di riflessi, il lavoro sulla carta tratta di riflessioni, e come la qualità intrinseca di tutto ciò che si riflette, i lavori nascono da un contrappunto. Cerco di catturare il secondo che finisce in quel secondo. E così, per sempre.
Comments